As partes anteriores deste post estão nos links abaixo:
1ª Parte
2ª Parte
3ª Parte
4ª Parte
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Antes de começar este post, tenho que passar um conceito de física dos líquidos,
Um sifão é um dispositivo no formato de tubo, usado para remover líquidos de um recipiente, como mostra a Fig. 1, ou para transferir líquido de um recipiente para outro.
Para iniciar o escoamento, o sifão deve estar preenchido por líquido
que, uma vez em contato com o líquido do reservatório, escoará até que
ocorra o nivelamento deste com a abertura do tubo.
Retirei este trecho do site da REVISTA BRASILEIRA DE FÍSICA, de um artigo chamado TRANSFERÊNCIA DE FLUÍDO POR MEIO DE SIFÃO VS. APLICAÇÃO DA EQUAÇÃO DE BERNOULLI, o texto pode ser lido na integra
AQUI.
Agora sim, posso continuar a contar minha história.
Como falei no post anterior, estava com um motor quebrado, tinha saído de um encalhe, encontrei o triângulo da vela, limpei o casco do Vivre e depois disso fiquei com o dia livre. É legal ficar a toa no barco, dá pra refletir sobre muita coisa, acho que o balanço do mar ativa a parte do cérebro que cuida da reflexão e da meditação, é maravilhoso.
Resolvi fazer um bom almoço com os ingredientes que eu tinha na geladeirinha do Vivre, almoço feito, consumido, sobrou a louça para ser lavada o que foi feito logo após uma sesta.
No início da tarde o Vivre já estava arrumadinho e fui preparar o barco para a travessia, por conta do vento, da maré e da minha vontade de velejar a noite eu tinha decidido que levantaria âncora as 3:00hs da manhã, dei uma geral nas velas, nas adriças, nas escotas, nas luzes de navegação, ABASTECI O MOTORZINHO DO VIVRE pois a ideia era sair da enseada de Ubatuba a motor e dai pegar um través até onde fosse possível, verifiquei o nível de combustível no tanque, tinha combustível mais do que suficiente, tudo pronto e o barco parecia ansioso para ser solto no mar, claro, eu também não podia me aguentar, então resolvi adiantar a viagem e abri a carta náutica, comecei a traçar a rota e passar os pontos para o GPS, plotei um ponto no meio da enseada, outro bem distante da Ponta Grossa, onde eu pretendia subir todo o pano, e outro ponto no través da Ilha das Cabras, olha ai os waypoints:
ENSEADA DE UBATUBA: 23º26.000`S / 45º02.000`W
PONTA GROSSA: 23º28.000`S / 45º00.000`W
ILHA DAS CABRAS: 23º31.000`S / 45º04.000`W
Só estes pontos me bastaram, da Ilha das Cabras até a poita o Vivre faz sozinho.
Por volta das 19:00h me deitei para ver se dormia um pouco, estava um friozinho muito bom para tirar um cochilo, estou conseguindo dormir melhor quando o Vivre esta na âncora, e isso não é bom, portanto, programei o celular para despertar de hora em hora, e as 2h da manhã eu iria levantar de vez e dar mais uma conferida no barco e aguardar até as 3h para levantar âncora. Assim foi, de hora em hora eu dava uma espiada no fundeio para ver se estava tudo bem, as 2 da manhã me levantei, dobrei as cobertas, fiz um cappuccino, lembrei no presente de casamento de novo, a roupa para a travessia já estava separada, um casaco bem grosso, uma camiseta de manga comprida, calça de moletom, meias, um tênis tipo iate com a sola bem macia, um "boné de orelha" que ganhei no dia dos país de 2013 e um colete salva-vidas tamanho G por cima de tudo.
Antes de sair dei aquela conferida em tudo, cabos, velas, GPS, Rádio, dei partida no motorzinho deixei ele esquentando um pouquinho, vento não tinha, mas eu esperava que ele aparecesse, tudo pronto, visto, revisto e conferido, subi a mestra e recolhi a âncora. Em algum post perdido no meios dos mais de 140 posts desse blog eu perguntei se é correto navegar de vela e motor, hoje eu sei a resposta, dependendo do vento vou só de mestra, pois ir contra o vento com a genoa aberta faz com que ele fique panejando, se a direção e velocidade do vento forem suficientes para inflar a genoa abro ela também. Estava uma noite clara, dava para ver tudo, mas a noção de distância da costa é diferente quando esta de noite, por isso eu fui seguindo o GPS, queria chegar logo no ponto que marquei lá na Ponta Grossa, um terralzinho começou a soprar tímido e com isso a temperatura caiu mais um pouco, pensei em arrumar uma balaclava, aquela touca tipo ninja, para a próxima travessia noturna, faltando mais ou menos meia milha para atingir o ponto marcado no GPS, o combustível do tanque do motorzinho acabou, já esperava isso, peguei a mangueira do tanque maior para fazer a transferência, bombeei a perinha alguma vezes e nada de gasolina, achei estranho, sabia que o tancão estava cheio, achei que poderia ser a posição, fui ajeitar o tancão e percebi que ele estava VAZIO, sim, na hora me toquei do que tinha acontecido, quando enchi o tanque do motorzinho no dia anterior eu amarrei a ponta da mangueira, mas ela escapou e eu não percebi e ai o texto lá no começo deste post provou que funciona mesmo, pelo efeito sifão a gasolina foi toda pro mar durante a noite, PUTZ, não sei se fiquei mais bravo pela burrice de deixar isso acontecer, pela burrice de conferir tudo e não perceber que o tanque estava vazio ou se por deixar a gasolina vazar na água, ainda vou dar um jeito de reparar essa agressão que causei ao mar, pensei que plantar uma árvore daria um compensada na situação, e ai a cena se resume ao seguinte: no meio do mar bem longe da costa, graças a Deus e as lições aprendidas com o Stark, sem uma gota de combustível, um vento fraquinho fraquinho e o Walneizinho sentado no cockipt acendendo um cigarro para pensar no que fazer, quando você mantém a calma, metade do problema já esta resolvido, pensei em continuar a vela até a Ribeira, mas não achei prudente, então, decidi voltar.
O vento que era de popa agora era contra e estava fraquinho, sabia que isso ia demorar, que teria que fazer vários bordos, me vesti com a paciência dos homens do mar, respirei fundo e fui na proa para desatar e subir a genoa, estava voltando para o triangulo da vela.
O Vivre não é um barco rápido, mas tem uma característica que acho fantástica e aprecio muito mesmo, qualquer soprinho de vento empurra o barco a 1,5 nós, tenho a impressão que se a criançada for lá na proa e começar a assoprar a vela o barco anda, meu barquinho realmente foi feito pra mim.
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O astro rei nascendo na popa do Vivre.
Assim que ele nasceu os golfinhos chegaram. |
Lembra que eu falei que tinha apanhado um pouco no vento contra na saída da Ribeira, pois é agora não apanhei nada, fiz direitinho, cada bordo executado sem muito esforço, posso dizer que foi perfeito. Velejar com um bom vento é gostoso demais, porém, conseguir tirar o máximo do barco com um ventinho de mais ou menos 3 nós é uma coisa que realmente da a sensação de vitória, satisfação pessoal, alegria, como eu disse, veleiros sempre oferecem uma oportunidade de você se sentir bem.
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Entre um bordo e outro uma selfie, vejam o motorzinho
levantado para diminuir o arrasto. |
De mansinho o vento foi aumentando e ficando dentro da previsão do windguru que era de 6 nós, mas a previsão errou feio na direção, pode ser por conta da geografia da enseada. As 6h mais ou menos a melhor surpresa do dia, acho que foi um premio por fazer tudo direitinho (tirando o fato de deixar acabar a gasolina), já dentro da enseada vi alguns golfinhos, e mais, e mais, e mais, eram uns 5 ou seis bandos de 4 ou 5 golfinhos cada bando, fantástico, tentei tirar algumas fotos e até fiz um filme, mas não dá pra ver direito os bichinhos por isso não postei o vídeo, assim que decidi deixar os golfinhos e voltar a atenção para a velejada, afinal o vento poderia acabar a qualquer momento e eu tinha que chegar no ancoradouro, desliguei a câmera do celular e imediatamente após isso não é que um golfinho da um lindo salto, por muito pouco não consigo filmar, vai ficar como história de velejador né?
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O Acrux e seu parceiro Edmur |
Pronto, as 9h estava de novo no triangulo das velas, me preparei e fui comprar combustível, remando, e muito, comprei a gasolina e dei uma paradinha na padaria para tomar outro café.
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Foto de autoria do Edmur |
Voltei remando também, assim que cheguei no barco o Edmur do Acrux me chamou pelo nome, e disse que acompanha o blog desde antes de comprar o Acrux, fico muito feliz quando isso acontece, mas também fico envergonhado, acho que não escrevo bem, confundo desse com deste, porque, por que e por quê, acho que uso muitas virgulas, crase então, vira e mexe tenho dúvidas, mesmo assim insisto em escrever. Gostaria de agradecer o Edmur pelo carinho que demonstrou por mim, pelo blog e pelo Vivre, ele fez uma coisa que ainda não tinha acontecido, tirou fotos do vire enquanto eu saia da poita com os panos em cima, fiquei rodeando o Acrux, só com as velas, enquanto conversava com o Edmur, trocamos telefones, ele me incluiu no grupo do WhatsApp da Flotilha Itaguá e depois me enviou as fotos pelo grupo, foi demais.
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outra foto que o Edmur tirou, adorei essa! |
Voltei para a Ribeira usando o motor, quando cruzei o Boqueirão e aproei para o meio da enseada do Flamengo, outro presente de Éolo, um bom vento pelo través de boreste, desliguei o motor e subi a genoa, atingi 4 nós só com a força do vento, que nem era tão forte assim, é acho que estou melhorando muito, to subindo de fase a cada velejada, depois de uns 30 minutos liguei o motor também e ganhei mais 2 nós e as 14:40hs estava na poita.
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Velejar de meias, calça comprida,
camisa de manga comprida e boné
proteje do sol! |
Fechei a gaiuta principal do Vivre cheio de histórias e ansioso para
começar a escrever logo os posts, minha cabeça já começava a escolher as
palavras para conseguir contar as grandes emoções que passei entre os
dias 30/07 até 02/08 de 2015. Confesso que durante a viagem de volta pra
casa foi muito difícil manter a concentração na estrada, não conseguia
deixar de pensar nos incríveis momentos que vivi a sós com o Vivre!